Aqui. Nessa gaveta. Minha gaveta. Em um armário. Possivelmente, atrás de uma porta. Minha casa.


segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

agora os móveis inabitados
todo o contra-movimento
de uma cadeira desocupada
e os vestígios do que era
quando ali
ele sentava para assistir televisão


hoje restou somente
o oposto do que é
e era o contrário e se não fosse
seria nada pois tudo é movimento
de uma sensação inteira de ser e
de pertencer
à carne espaço-temporal do paradoxo
entre não ser o que se tem sido


agora eu observo a televisão
secretamente esperando re-ser
e a cadeira vazia do que era
sou um espelho
que deixa de vigiar a casa
e irrefletido no seu interior
não é mais reflexo do passageiro e
faz em si impresso
na duplicação de objetos-verbos
ranhuras no tempo
saudade do passado
no negativo
ausente presente do indicativo
de quem era o que me fez
memória de ter sido


um esquecimento

que se faz hoje
do lembrar e sentir falta
do que ficou ali

gravado no tecido da casa

pó das lembranças

aqueles dias ficaram
nos leitos da memória
luz refratada
ou sol de cor
amarelada que entra e
se derrama pela casa:


eu
imerso no sofá da sala
observava em todos os cantos
os mais ínfimos detalhes da uniformidade
das paredes e que
os tons quentes desciam do céu e
aqueciam como a um recipiente e
entram pela porta da frente
atravessando tudo
até o corredor deixando
no rastro de um anguloso feixe
revelar a fina chuva prateada
ou o pó das lembranças
de coisas presentes mas
que só a memória nos fala

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Da água ao sentido

Mão n'água lavada
Água na mão lavada
Duas mãos agarram a água
E quando tiradas
Ficam as migalhas

Gotas

Gotas

Dispersas
Que se quiserem
Se juntam
E novamente
Água
Que novamente
Pode-se tentar segurá-la
Imaginá-la, desejá-la
Palpável
Significativa
Um passo
Distante
Para trás
Me afasto do
Mar
Para o olho banhar-se
No mais possível
Panorama
Da loucura
Que
Aqui
Indissociável
Sento

segunda-feira, 5 de março de 2012

Barulhos

Um estalo:

Lentamente caio;

Me dobrando falsamente,

Sem ser mais fantasia.


Pois deitado ao teu lado

Sou realidade.

Que deseja

Ser poesia.

sábado, 23 de julho de 2011

Olho

Olho um olho no espelho

Que viu que eu olho

E me olhou interessado


Dizem


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Não importa que falem
Proclamem, afirmem
De forma vazia.

Não importa que tentem
Com essas palavras
Conhecer-te um dia.

Ou que delas tenham conhecido
Num fingimento desmedido.

Verdade:
Não importam palavras
Dissimuladas, mentiras,
Bajulações Interesseiras desonestas
Frívolas e fugazes, olhares,
Que existem ou existiram.

Não me importa
O que não tenha saído da minha boca.
Não me importa isso tudo que não compartilho.

O louco desejo burro: desperdício.

Me importa que tenha sido isso,
descomprometido;
Que terno e honesto eu ainda não tenha visto,
Que talvez não exista.
Que a culpa possa ser dividida.

Me importa, sim!
Que estou aqui mas não faço parte.
Uso dos mesmos segundos
Mas conto a hora de outra maneira.

Me importa que seja louco,
Não por ser louco, mas
Por querer ser outro
- ainda sendo eu.

Me importa que julguem
Com tanta leviandade
Teus momentos,
Que tão admiráveis
Nada têm de ordinários.

Me importa que sou verdade,
Penumbra e claridade;
Que tenha dito e continue dizendo
O que todos dizem incertos.